Riscos Associados às fraudes e suas consequências para o Agronegócio
O AGRONEGÓCIO passou por significativas transformações nas últimas décadas: novas culturas, evoluções tecnológicas e mudanças nos cenários econômico, político, creditício e de ordem ambiental.
Tais aspectos trouxeram-nos a realidades extremamente complexas e suscetíveis a incertezas e a eventos de grande impacto. Nesse contexto, a competitividade do setor depende de uma série de decisões e estratégias em relação ao futuro, visto que os atores e os agentes do agronegócio operam expostos a riscos, cujo tipo e intensidade podem afetar a credibilidade de um setor ou de um país.
Uma dessas exposições de impacto a que está sujeito o agronegócio é a verificada na logística e no transporte de cargas, especialmente para a hipótese de crimes praticados nos diferentes modais, rodoviário e ferroviário. Identificam-se, também, tais práticas nas áreas de portos alfandegados.
Note-se que essas práticas criminosas contra o transporte de cargas de produtos originários do agronegócio obrigam o setor a lidar com as suas graves consequências, como a adaptação aos cenários para assegurar a manutenção e o atendimento das demandas dos negócios, internos e externos.
Em tempo não muito distante, o transporte de cargas do agro foi prejudicado por uma recorrência de crimes na malha ferroviária santista, fruto de roubos praticados contra vagões transportando distintos grãos. Aliás, foi uma prática criminosa, segundo fontes oficiais, realizada a mando de uma organização que, aproveitando-se da situação de miséria dos moradores de uma área próxima aos trilhos, cooptava pessoas para os ataques aos trens de carga. O produto resultante do roubo era, então, destinado a receptores que destinavam as mercadorias roubadas à fabricação ilegal de rações.
As infrações fraudulentas carregam indícios de prejuízos adicionais ao fisco nacional, inerentes à provável emissão de notas fiscais falsas, para acobertar a adulteração de carga nas áreas próximas e/ou no interior de portos alfandegados. Observa-se que a realização de boletins de ocorrência – documentos elementares para a transformação da narração de uma notícia de crime num discurso oficial – pelas vítimas não tem gerado os efeitos esperados para a diminuição de infrações.
No modal rodoviário e contra o transporte de cargas, vem sendo observada a ação de grupos criminosos organizados, os quais, ao atuarem em diversas frentes, não se limitam apenas aos roubos ou à apropriação indébita de mercadorias.
Esquemas sofisticados de adulteração de lotes de grãos e farelos, pela contaminação de cargas por resíduos de origem vegetal e mineral (“chave na mão”), vêm alastrando-se pelos terminais de exportação, causando impactos significativos tanto sobre o setor, como sobre a economia como um todo.
Os efeitos negativos associados às fraudes no agronegócio podem afetar a confiança dos investidores e a estabilidade do mercado, repercutindo em prejuízos financeiros e danos à reputação dos produtos brasileiros no mercado exterior.
A busca por soluções inclui a prevenção e a repreensão desses ilícitos e extrapola o âmbito de atuação do setor privado, cujos protocolos de controle de qualidade são elaborados e executados em atendimento das normas oficiais aplicáveis à produção, ao transporte, ao manuseio e à comercialização, as quais objetivam assegurar a conformidade dos produtos agrícolas.
Registre-se, por oportuno, que essas práticas criminosas geram impactos de custos a curto e médio prazos em toda a cadeia do agronegócio, sendo esses de numerosas ordens: financeiros; de logística; com pessoal; contratuais; de reprocessamento; quanto a atrasos; multas contratuais; e danos à imagem.
Tem-se reclamado, desta forma, uma participação ainda maior da administração no sentido de se buscar a constru-ção de políticas públicas e privadas que tragam uma maior visibilidade para o problema e se observar a necessidade de criar iniciativas que minimizem os impactos negativos dessas infrações, cujos reflexos podem afetar as relações comerciais com os parceiros globais do País.
Nesse sentido, destaca-se a disponibilidade do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) em atuar nessa direção, ou seja, em parceria com distintas entidades atingidas, direta e indiretamente, pelos resultados nefastos das já narradas práticas.
Entretanto, esses crimes são complexos e desafiadores, requerendo ações coordenadas e integradas, envolvendo a participação de órgãos de segurança pública, que dispõem da tecnologia e da expertise necessárias à identificação das potenciais ameaças, bem como do poder de polícia para a aplicação das medidas coercitivas cabíveis.
Espera-se, em conclusão, mas sem esgotamento do tema aberto para debate, que as autoridades de segurança pública, federais e estaduais, também demonstrem interesse em integrar essas frentes de trabalho.
Trata-se de uma integração reclamada às autoridades de segurança pública, que devem tomar as medidas necessárias para a mitigação dos riscos registrados em boletins de ocorrência, que fundamenta o mapeamento das zonas de crime.
Alguns dos instrumentos previstos, nesse sentido, incluem a elaboração de planos de inteligência e ação, com diferentes níveis de prontidão, para a eventualidade de os perigos se manifestarem. De modo mais amplo, deve haver a constituição de estruturas institucionais, legais e de governança para a gestão das infrações relatadas, consideradas nas suas diversas categorias e com um objetivo comum: viabilizar a logística e o transporte de cargas seguros para o escoamento de mercadorias do agronegócio, isto é, para um ainda maior crescimento do setor e a manutenção da sua positiva imagem.
Essas ações são essenciais para proteger o agronegócio contra fraudes, garantindo a credibilidade, a sustentabilidade e a competitividade do setor no mercado global.
SEGURANÇA LOGÍSTICA E EXPORTAÇÕES DO AGRO BRASILEIRO
Em vista das dificuldades enfrentadas na logística e no transporte de cargas no Brasil, vale refletir sobre as dimensões de escoamento que podem ser impactadas pela melhoria na segurança desses processos.
Em 2023, as exportações do complexo soja no País apresentaram volumes inéditos. As vendas para o exterior fecharam em 101,86 milhões de toneladas de soja em grão, 22,5 milhões de toneladas de farelo de soja e 2,3 milhões de toneladas de óleo de soja. A receita consolidada com essas exportações foi de US$ 67,3 bilhões.
Fonte: Revista Agroanalysis, FGV
AUTORES
Fátima Parizzi
Engª Agrônoma - Consultora Técnica
Abiove
Dalton Cesar Cordeiro
Diretor de Tributação e Negócios Jurídicos